segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Duas noites de amor



Ao ar livre, a música parecia envolver todo o seu corpo. Era como se dissipasse no espaço e não existissem limites… Olhou em frente. Ele ainda ali estava, a poucos metros, praticamente sem se mexer, a contemplá-la no meio do fumo e das luzes intermitentes. “Não vou ter com ele”, pensou, triste, repetindo as palavras como se se tratassem de um mantra. Mas o corpo amolecia ao sentir o olhar dele preso à sua pele. “Se cederes ao teu desejo, esta história nunca vai terminar…” Porém, ele estava tão perto, com os olhos verdes esmeraldas rasgados, a boca que formava o mais inebriante dos sorrisos, o corpo elegante e sensual. E Paula sabia, com cada célula, que ele a desejava com intensidade.


Fechou os olhos, tentando dessa forma abstrair-se da realidade. Recordou a primeira noite. Esbarrara com ele naquele mesmo local. Ele segurara-a com os braços musculados, impedindo-a de cair no chão. Trémula, Paula agradecera-lhe, sentindo, ao contacto com as mãos, um formigueiro a percorrer-lhe a pele. Os lábios de Martim abriram-se num sorriso, os olhos verdes brilharam e perguntou-lhe o nome, com uma voz ligeiramente rouca. Como que hipnotizada, Paula respondeu. O que aconteceu depois, foi surpreendente. 

Dançaram toda a noite, os corpos crescentemente mais próximos, as pernas a tocarem-se, as mãos dele na sua cintura, descendo depois com volúpia pelas coxas bem delineadas, o cheiro que se libertava do seu cabelo a inebriá-la. Nunca se tinha entregado assim a um homem logo da primeira vez que o conhecera, nem sentido frisson quando ele, enlaçando-lhe a cintura com firmeza, começou por beijar-lhe o pescoço, as orelhas, as faces, o canto dos lábios, para, por fim, tocar a sua boca, envolvendo-a num beijo intenso, profundo, que lhe roubou o folego. Saíram dali para o apartamento dela, onde Martim, deitando-se sobre a cama, lhe pediu: “despe-te para mim”. De início, a natural inibição de Paula veio ao de cima, mas ele repetiu o rogo com tanta emoção e desejo expresso no rosto moreno, que, pensando “por que não”, Paula deu por si a mover as ancas com sensualidade, sentindo-se uma figura das Mil e uma noites. Primeiro a camisola de alças caiu no chão, depois, a saia curta. 

Por fim, virando-se de costas, despiu o soutien. Virou-se, tapando os seios com as mãos. Ele observava-a com os olhos brilhantes e um sorriso rendido. “Deixa-me vê-las.” Devagar, Paula deixou expostos os seios rosados. Todavia Martim não estava satisfeito. Sob as calças, Paula deu conta do pénis já ardendo de desejo. Mas antes pediu-lhe para tirar o string. Só a seguir se ergueu da cama, se aproximou e a começou a beijar, pedaço a pedaço. Paula estava também mergulhada na vertigem louca da volúpia. Despiu-o com avidez, cobiçando tocar, cheirar, beijar aquele corpo… O desejo era de tal forma ardente que ele a penetrou de pé, contra a parede, suspendendo-a no ar com as nádegas nas suas mãos. O orgasmo foi rápido, intenso e avassalador, uma subida apoteótica aos céus, uma chuva de estrelas que se abateu naquele quarto. Amaram-se toda a noite, até que adormeceram esgotados.

Na manhã seguinte, ao acordar, Martim não estava lá. Apenas uma rosa vermelha que ele devia ter roubado no canteiro da vizinha. Dividida entre a desilusão e a raiva. Paula tentou retomar o rumo normal dos dias depois daquela noite. Mas, no sábado seguinte, na esperança de reencontrá-lo, regressou à mesma discoteca, junto ao mar. Procurou-o com os olhos, porém foi ele que lhe surgiu à frente, de surpresa, arrastando-a para um lugar mais sossegado, Nos olhos dele, o mesmo brilho. As palavras, breves, foram murmuradas: “Senti a tua falta”. Depois um beijo, muitos beijos, e mais uma noite de amor.

Após de terem saciado o desejo nos braços um do outro, Paula perguntou-lhe: “Vais desaparecer novamente?” Martim ficou pensativo. “Há uma coisa que tens de compreender se me queres voltar a ver – não me podes tentar prender.” Paula pensou ripostar com fúria, mas consegui perguntar calmamente: “Não estás apaixonado por mim, é isso?” Nesse instante, ele olhou-a com carinho e puxou-a para junto do peito nu: “Não percebeste, pois não? Isto não tem nada a ver com aquilo que sinto. É uma questão da minha maneira de ser.” Paula não compreendia. Tinha a certeza que estava apaixonada, apesar de quase nada saber a seu respeito. Desejou esquecer, disse a si própria que devia mandá-lo embora, mas deixou-se ficar, segura nos seus braços até que o sono a venceu. E ele não estava lá de manhã, apenas mais um rosa vermelha.

A semana seguinte passou como se estivesse sonâmbula. Desejava vê-lo e prometia a si mesmo não regressar ao mesmo lugar. Os amigos diziam que ela era louca, que se tratava de mais um Juan de bolso, que andava por aí a seduzir raparigas na noite. “Não sabes nada dele”, repetiam. Ela ainda pensava responder que sabia que ele adorava passear descalço pela praia em noites de luar, que gostava de ver a forma como a luz se refletia no seu rosto, que amava o som do jazz… Confidências de duas noites de amor que valiam mais do que dez anos de conversas. Mas voltou. Encontrou-o sozinho, junto ao mar, afastado da confusão. Dirigiu-se até lá com passo seguro. Ele adivinhou a sua presença, dizendo, ainda de costas: “Pensava que nunca mais chegavas…” Porém, Paula tinha tomado uma decisão: “O que aconteceu entre nós não se vai repetir. É só isso que te queria dizer.” E, com lágrimas nos olhos, regressou para a pista, onde a música a envolveu. 

Agora, estava ali, sentindo-se observada fixamente por ele, que porém não vinha ao seu encontro. Com medo de ceder, despediu-se dos amigos e correu porta fora. Aquele sonho (ou pesadelo) terminara. Mas quem dizia que o conseguia esquecer? A imagem de Martim colara-se de tal forma às paredes do seu cérebro, que dois dias passaram em que não conseguiu dormir… Pensou ir ter com ele no próximo fim-de-semana, era preferível estar infeliz com Martim do que sem ele. Contudo, não foi necessário voltar. Porque, ao final do terceiro dia, ele esperava-a, sentado nos degraus da porta, um ramo de rosas na mão. Sorriu-lhe ao longe e, quando Paula se aproximou, lançou-lhe o mais radiante do sorriso, “Será que podemos começar do novo?”, perguntou, quase junto à sua orelha. “Sem fugas de madrugada?”, retorquiu Paula. “Prometo”, disse, antes de envolvê-la num beijo.

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