quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Despertar do engano

”Anda cá e despe-me.” Foi com estas palavras que Anabela o esperou. Tinha vestido um vestido comprido, de cetim, com alças finas, que se moldava ao corpo a cada movimento. Pedro sentiu-se dividido – viera dizer-lhe que estava tudo acabado, mas ela mostrava-se novamente como uma pantera. Como se adivinhasse o que se passava, usava as suas armas mais poderosas – o corpo, felino, para o levar a adiar uma decisão. Desta vez seria forte.

Mas ela aproximou-se e colou-se a ele, os seios duros contra o seu peito, e logo a mão pousou entre as suas pernas com movimentos sensuais. Ela baixou-se, tirou-lhe o cinto, ignorando o pedido para que esperasse, por que tinham de conversar. Levantou a cabeça e sorriu-lhe, antes de abrir o fecho e segurar entre os dedos o pénis que transportou até aos lábios vermelhos e começou a sugar. Uma vertigem envolveu-o quando sentiu que o orgasmo se aproximava…

A seguir, segurando-o pela mão, levou-o para o quarto, prendeu-lhe as mãos à cama e, levantando o vestido, sentou-se em cima dele. O pénis (porque tinha de ser tão desobediente aos desígnios do seu cérebro), estava de novo erecto e entrou dentro dela. Anabela, com movimentos voluptuosos, conduziu-os, mais uma vez, a um orgasmo podero. No final, Pedro tinha perdido a coragem. Apesar de, por vezes desconfiar que Anabela fazia aquilo de propósito, ela mostrava-se sempre tão apaixonada quando faziam amor… E mais uma vez passou a noite em casa dela, prisioneiro do desejo que parecia ser capaz de o conduzir à escravidão.

No dia seguinte, quando entrou no escritório, ligou a Sara. “Vamos almoçar?”, perguntou. A jovem aceitou o convite e o coração dele batia mais depressa.

Chegou mais cedo ao restaurante e bebeu um martini enquanto aguardava. Por que insistia em manter a esperança? Ele namorava com Anabela e Sara era sua amiga. Tinha-as conhecido quase ao mesmo tempo, numa festa. Mas enquanto Anabela sobressaíra pela sua beleza, Sara era mais tímida, quase envergonhada de existir. A primeira seduzira-a em cinco minutos, mas o início dessa relação marcou também o princípio de uma amizade crescente com Sara. Aos poucos, nos momentos em que estavam juntos, aprendera a gostar de se escapulir uns minutos para junto dela, principalmente nas festas barulhentas que Anabela tinha a mania de organizar, com dezenas de pessoas desconhecidas e música ensurdecedora. Nesses instantes, falavam e descobriam um monte de afinidades, que os tornavam cada vez mais cúmplices. Sem se aperceber de início, e há medida que a futilidade e o materialismo de Anabela se tornavam mais óbvios, Pedro ia-a usando como ponto de comparação. E Sara, a doce e sensível Sara, com as suas feições angelicais, saía sempre a ganhar.

Tinham ganho o hábito de almoçar juntos duas vezes por semana. De início, falava de Anabela e Sara era solícita nas tentativas de ajudar a resolver o crescente afastamento do casal. Depois, esse tópico foi deixando de fazer parte da conversa, que versava sobre eles, os seus sonhos, ambições e tristezas. Anabela costumava gozar com esses almoços: “Devem dizer mal de mim o tempo tudo”, dizia, só para chamar a atenção sobre si própria, apesar de, no fundo, ter uma opinião tão boa sobre si mesma que tal ideia era inconcebível. Nem sequer se dava ao trabalho de mostrar ciúmes – homem que a tivesse a ela não podia desejar mais ninguém…

Nesse dia, Pedro estava decidido a contar a verdade a Sara – que queria terminar tudo com Anabela. O resto– que estava apaixonado por ela – dir-lhe-ia mais tarde. Não seria o momento certo.

Sara chegou, mas desde logo Pedro compreendeu que algo mudara. Não parecia à vontade, como se algo a perturbasse. Antes de tentar perceber o que se passava, desabafou – “Vou terminar a relação com a Anabela”. Sara empalideceu. “Mas como? Ela vai ficar destroçada…” , disse. “Sabes que não temos nada em comum e que há muito que não me sinto feliz. Chegou o momento. Se ao menos ela facilitasse…” E contou-lhe como, na noite anterior, chegara decidido e ela conseguira, mais uma vez, adiar o momento. Sara pareceu irritada – “Se quisesses realmente fazê-lo, não ias nos seus jogos de sedução.” De seguida, fez um esforço para acalmar-se.Também tinha algo a dizer, confessou. “Temos de acabar com estes almoços. De facto, acho que devemos estar um tempo sem nos vermos. Não faças perguntas. Mais tarde, talvez te possa explicar.” Com os olhos molhados, levantou-se da mesa. Mas antes, Pedro segurou-lhe na mão. Sentiu que todo o corpo de Sara estremecia com aquele contacto. Puxou-a de novo para a mesa. “Quanto mais tempo vamos fingir um ao outro que nada aconteceu nestes últimos meses?” , perguntou. Viu Sara empalidecer e ficar ainda mais nervosa. Desta vez, não conseguiu conter as lágrimas. “Tinha tantas esperanças que fosse apenas eu… Seria mais fácil.”, confessou. “Eu sinto o mesmo que tu e não podemos fingir que isso não é real. Vou acabar com a Anabela mas é para ficar contigo.”

Olharam-se demoradamente. Estava tudo dito. Sara tinha a cabeça baixa e as lágrimas corriam. “Nunca me vou perdoar. É como se fosse traição. Ela é minha amiga.”, desabafou. Pedro sentia-se demasiado seguro do que sentia para deixar que o momento se perdesse: “Nem tu nem eu tivemos culpa. A Anabela vai ter de compreender isso. Vamos embora daqui.”

Beijaram-se pela primeira vez num miradouro com vista para o rio. O sol brilhava num céu onde brincavam algumas nuvens. Nunca Pedro esqueceria aquele beijo, a doçura e a paixão contidos nos lábios de Sara. Levou-a para sua casa, onde a despiu devagar, beijando-lhe tudo o corpo, de uma beleza quase éterea. Fizeram amor abraçados, sentido os corações a bater em uníssomo, a pele suada, o ritmo do prazer de cada um.

Há noite, Pedro tomou um banho e vestiu-se. Beijou Sara demoradamente. Dirigiu-se a casa de Anabela, que o esperava. Desta vez, a porta estava entreaberta. Chamou-a e ela respondeu do quarto. “Veste-te. Temos de conversar.” Anabela ainda lutou. Saiu dos lençóis, onde o esperava, e mostrou o corpo nu, voluptuoso. Mas, desta vez, nada tremeu dentro de Pedro. O rosto fechado fê-la hesitar. Envolveu-se num roupão. Escutou o que ele tinha para lhe dizer. Depois, com desprezo, limitou-se a dizer que ele tinha feito a pior opção da sua vida. Quem possuira alguma vez uma mulher com ela nunca mais encontraria ninguém que o satisfizesse. Pedro limitou-se a sorriur e encolher os ombros. “Como estás enganada”, disse, antes de bater com a porta da rua pela última vez.

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