sábado, 18 de maio de 2013

Ao som da música




O som abafava todas as vozes. As luzes eram hipnóticas. A música fazia os corpos moverem-se freneticamente.

Inês estava no meio da pista da discoteca, os olhos fechados, o corpo a balançar seguindo o ritmo, os braços no ar, a mente vazia… Era o seu último dia de férias. E isso era algo que ela desejava conseguir esquecer.



Por isso, dançava cada vez mais depressa, tentando que todos os pensamentos abandonassem o seu cérebro. Principalmente aqueles que tinham a ver com Filipe.

Mas eram esses os mais teimosos.

Porque é que não o conseguia tirar da cabeça? Baixinho, repetia como uma ladainha, “ele nunca será teu”, “ele nunca será teu.”

Provavelmente, naquele mesmo instante, ele estava com Rita. Não fora sempre dela que Filipe gostara durante aqueles quatro anos do curso? Não fora sempre atrás dela que ele andara, como um cão atrás do dono. E com quem é que ele desabafava quando a Rita o tratava mal? Com Inês, claro.

Agora, na viagem de final de curso, nada mudara. Por que é que Inês se convencera que era agora ou nunca? Lá porque Filipe se tornara sentimental na noite anterior (com a ajuda de umas cervejas), dizendo-lhe o quanto ia sentir a sua falta e o quanto ela fora importante para ele durante aqueles anos, isso não lhe dava o direito de acreditar que alguma coisa ia mesmo mudar, que, por qualquer milagre da natureza, ele se ia aperceber que era por ela, e não por Rita, que estava apaixonado. Lá porque Filipe não procurara a companhia de Rita uma única vez na noite anterior, convidando-a em vez disso a ela para dançar, lá porque lhe acariciara o cabelo com ternura infinita, fazendo o coração de Inês estremecer, isso não devia ser suficiente para ela acreditar que, afinal, Filipe iria ser seu!

Esperou a noite toda por um beijo que nunca chegou. Ele não saiu de ao pé dela, puxou-a pela mão para dançar, falou-lhe ao ouvido, mirou-a com os olhos brilhantes, mas esse beijo nunca chegou. E como Inês o desejava, nem que fosse um só e numa só noite da sua vida. Mesmo que, no dia seguinte, Filipe se arrependesse, Inês teria pelo menos a recordação desse instante para a alimentar nos dias futuros.

Os colegas repararam que havia um clima diferente entre eles. Amigas dela comentaram: “o que é que se passa hoje com o Filipe?” e ela limitara-se a sorrir. Mas no final da noite, já no hall do hotel, quando cada um ia para o seu quarto, ele limitara-se a dizer-lhe ao ouvido “gosto muito de ti” para depois se afastar.
No dia seguinte, na praia, ele mantivera-se um pouco distante dela, como se envergonhado pela forma como se comportara na noite anterior. Rita mostrava-se extremamente solicita para com ele. Estendeu a toalha ao lado da de Filipe e ali montou a tenda. Inês limitou-se a observá-los à distância. Em silêncio.

Depois de jantar, o grupo separou-se. Alguns deles foram para a discoteca, os outros disseram que iam lá ter mais tarde. Entre esses, estavam Filipe e Rita. O coração de Inês estremeceu quando se apercebeu disso mas, como sempre, não demonstrou as suas emoções. Se era assim que tinha de ser, pronto, que fosse…

Agora, tentava que a música a fizesse abstrair de tudo isso. Que tirasse de dentro da sua cabeça a imagem de Filipe e Rita juntos, quem sabe na mesma cama… Mas a imagem teimava em não a abandonar.

Nisto, ao abrir os olhos, pensou que sonhava. Um pouco afastado, encostado a uma coluna, o rosto bonito escondido pelas sombras, estava Filipe. Que parecia preso em contemplação. Que parecia olhar apenas para ela. “Estou a sonhar” pensou a jovem, “quero tanto vê-lo que já alucino”

Não, era mesmo ele. Inês sorriu-lhe e fez um gesto com a mão, a convidá-lo para juntar-se a ela na pista.

Ele retribuiu o sorriso e aproximou-se.

Inês pensou perguntar-lhe o que fazia ali, onde estava Rita, mas acabou por não dizer nada.

Ele estava a dançar ao lado dela, as mãos dele na sua cintura, as coxas dela a roçarem as pernas dele, o perfume dele a entrar dentro dela, os lábios dele junto aos seus, as testas juntas, os corpos ao mesmo ritmo, o sorriso dele por tudo o lado, as peles coladas, o que é que estava ali a passar-se, mas era tão bom, a sensação de que Filipe a desejara, e eis que os lábios dele procuraram a medo os seus, como se tivessem medo que ela os rejeitasse e foi então que Inês percebeu que, durante tudo esse tempo, fora apenas isso que ele sentira, medo que ela não o desejasse, e então foi a vez dela procurar os seus lábios e dizer-lhe assim “vem, sou tua…”

Beijaram-se durante muito tempo, os lábios colados como se sempre tivesse sido assim, o desejo a nascer tão forte que acabaram por sair dali quase a correr, as mãos dadas, felizes, para o hotel, até se trancarem no quarto dele, tirarem as roupas, acariciarem-se com urgência e se fundirem num só.

E quando atingiram o clímax, ele gritou bem alto as palavras que ela sempre quisera ouvir: “amo-te”

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